Com linguagem acessível, humor popular na web conquista casas de show


da Folha de S.Paulo

Ao contrário do que se espera de uma casa de shows, não foram músicos os artistas que mais se apresentaram no Citibank Hall de São Paulo nos dois últimos anos. O primeiro lugar desse ranking cabe à Companhia de Comédia Os Melhores do Mundo, responsável por 25% do público (e da bilheteria) da casa no ano passado.

Os brasilienses, juntos desde 1995, têm como carros-chefes os espetáculos "Hermanoteu na Terra de Godah" (cheio de referências ao Antigo Testamento e com participação de Chico Anysio como a voz de Deus) e "Notícias Populares".

Entre as mais de cem apresentações que já fizeram desde 2006 no Citibank Hall, pelo menos 50 foram de "Hermanoteu" --conta que foi reforçada no fim de semana passado e que aumentará novamente no mês de abril. Os Melhores do Mundo já têm agenda fechada com a casa até 2011.

"O que nós fazemos é teatro, mas fora de teatros, e sem o público tradicional desses espetáculos", conta Carlos Henrique Rocha, produtor-executivo da companhia. A transformação do grupo em grande sucesso aconteceu em 2006, após o quadro do personagem Joseph Klimber, de "Notícias Populares", se tornar hit na internet.

Victor Leal, autor e ator dos Melhores do Mundo, credita o sucesso a um "humor que não é de TV, que pode ser politicamente incorreto, sem controle e sem censura", e cita como inspiração o grupo britânico Monty Python.

O DVD de "Hermanoteu" está há duas semanas no primeiro lugar dos mais vendidos de toda a rede Fnac. Na primeira semana de fevereiro, superou as vendas de Beyoncé, que ficou em segundo lugar, seguida do Metallica, em terceiro --artistas que recentemente se apresentaram no país.

O caminho trilhado pelos Melhores do Mundo, da web para as grandes casas de shows, com lotação para mais de mil pessoas, não é único. O fenômeno se repetiu com o comediante Marcelo Médici, com as esquetes de Marcius Melhem e Leandro Hassum, "Nós na Fita", e com os grupos Deznecessários e Z.E. - Zenas Emprovisadas (leia quadro ao lado).

Médici ressalva que, apesar de ser a ferramenta mais importante de divulgação, a internet pode prometer algo que os espetáculos não cumprirão: "É fácil ser engraçado por três minutos, ter um trecho ótimo, mas pode ser pegadinha. O cara talvez não segure duas horas de um show com graça".

Para Hugo Possolo, dramaturgo e diretor do Parlapatões, Marcelo Médici e os Melhores do Mundo têm textos de qualidade diferenciada, e conseguem sucesso por apostarem em um humor de linguagem direta e acessível, sem abandonar as questões críticas relevantes.

Público novo

Médici destaca que seu espetáculo solo fez mais sucesso entre o público do que a remontagem da peça "O Mistério de Irma Vap", em 2008, com Cássio Scapin e dirigida por Marília Pêra. "Consigo arrastar uma galera na idade que geralmente não curte teatro, como adolescentes e jovens casais."

Paulinho Serra, diretor dos Deznecessários, considera que faz um trabalho de criação de plateia. "Tem gente que nos assiste e não sabe o que é teatro." Serra destaca que apresentar os espetáculos em casas de shows confere um "selo de qualidade".

Além disso, como as companhias acertam os contratos com base em parte da renda obtida na venda de ingressos, geralmente mais caros do que em teatros, grandes lugares significam lucros maiores.

Maitê Quartucci, diretora artística das casas HSBC Brasil, em São Paulo, e Vivo Rio, no Rio de Janeiro, diz que a constante atualização dos quadros garante vida longa para esses espetáculos.

Para Quartucci, as comédias apresentadas combinam melhor com o perfil dos estabelecimentos que comanda. "Não dá para assistir a um drama de Shakespeare conversando com amigos e tomando uma Coca-Cola ou uma cervejinha, né?"

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