Rua Augusta, 486. Às 3h de um sábado, dezenas de pessoas se
aglomeram em frente ao Clube Outs, uma das muitas casas noturnas da região.
Para entrar, é preciso enfrentar seguranças engravatados e
desembolsar R$ 20. Lá dentro, flanelados, tatuados e emos dançam hits da música
pop dos anos 1980 e 90.
No dia seguinte, por volta das 18h, a casa continua a mil.
Mas as portas estão abertas a qualquer um. Sob a luz de holofotes, uma banda
anima um público jovem. Num telão, letras de músicas sobre louvor e compaixão.
No bar, as garrafas de Smirnoff e Heineken permanecem intocadas.
O show termina, e Junior Souza, 37, surge. Veste uma
camiseta preta estampada com o símbolo matemático que representa o
"diferente", tem o antebraço tatuado e brinco na orelha.
Dá alguns avisos, indica o lugar onde fica a caixinha de
contribuições e anuncia pelo microfone: "Agora a gente vai fazer um
intervalo e já continua o culto, beleza?".
A pausa serve para que os fiéis da Capital Augusta possam
trocar ideias. A Capital, como os habitués a ela se referem, é uma igreja
protestante, fundada em 2009 pelo pastor Junior. O grupo inicial era formado
por músicos, designers e gente que "já vivia a vida da Augusta",
segundo o pastor, que é professor de inglês e dá aulas na Faculdade Teológica
Metodista Livre.
Quando o intervalo termina, Junior, de frente para um
laptop, começa a ler um versículo da Bíblia. Carismático, ele às vezes quebra a
leitura e traduz um trecho sagrado para uma fala informal.
A maioria dos presentes ainda não chegou aos 30 anos. São
jovens antenados, que compartilham sua fé no Facebook e no Twitter. No site da igreja,
são disponibilizados podcasts religiosos.
Dono de um corpo tatuado, o skatista e publicitário Bidu
Oliveira, 20, diz que sofreu preconceito em outras igrejas e ali encontrou uma
comunidade. "O foco aqui é Jesus", justifica.
A Capital permite a ingestão de bebidas alcoólicas, desde
que com moderação. Sexo, melhor dentro do casamento. "O projeto ideal é a
castidade, mas, se não é essa a sua realidade, vamos seguir o caminho da
reparação", aponta o pastor. Gays são bem-vindos. "Na Augusta, é
natural que eles frequentem. Nosso slogan é: 'Proibido Pessoas
Perfeitas'."
Além do culto no Outs, há reuniões semanais nas casas dos
integrantes. "Ali dividimos as alegrias e frustrações da vida em SP",
diz Junior, um paranaense de Assis Chateaubriand.
Antes de chegar à capital, ele era ligado, no interior, a
uma igreja Vineyard, associação criada na Califórnia dos anos 1970. Não gosta
de ser chamado de evangélico. "Tenho vergonha do que esse termo se tornou
no Brasil", confessa.
O aluguel do imóvel na Augusta é bancado por 12 pessoas da
liderança da Capital. O dinheiro das doações, segundo o pastor, vai para
missões religiosas e outras instituições. Valentim Van der Meer, promoter da
boate, diz que aceitou alugar o espaço por simpatizar com a igreja. "É o
mesmo público que frequenta o Outs na balada."
Por volta das 21h, o culto termina ao som de Metallica. Por
uma coincidência irônica que só uma rua tão augusta pode permitir, a poucos
metros dali, no número 501, fica o Inferno Club. "É legal ter uma igreja
na porta do inferno, mas, infelizmente, ele não está acessível. Eles cobram o
dobro do aluguel daqui", diz o pastor, rindo.
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