Regina Braga: “Somos todos bissexuais”


Eu vivo com ele (Dráuzio).
Eu não escolhi viver com uma das minhas amigas.
E ele está feliz com isso. E eu também”

Casada há trinta anos com o médico Dráuzio Varella e mãe de Gabriel Braga Nunes, atriz conta que “se envolve com mulheres todos os dias”

O que para alguns é polêmica, para Regina Braga é assunto corriqueiro. Não só porque ela está em cartaz há dois meses em São Paulo com uma peça que aborda a vida da poetisa americana Elizabeth Bishop, lésbica assumida. Para a atriz, a opção sexual não é tabu. “Eu acho que nós somos, o ser humano em geral, somos bissexuais. Eu sou bissexual, qual é o problema?”, afirma ela.

Casada há trinta anos com o médico Dráuzio Varella, ela não vê problema algum em lidar com isso. “Eu vivo com ele. Eu não escolhi viver com uma das minhas amigas. E ele está feliz com isso. E eu também”, diz, categórica.

A atriz está em cartaz em São Paulo com a peça “Um porto para Elizabeth Bishop”, sobre a estadia da poetisa americana por longos quinze anos no Brasil. Mesmo texto que ela apresentou, com igual sucesso, dez anos atrás. Em novembro, estréia no Solar de Botafogo, no Rio. Em breve volta à TV (sua última participação foi em “Tititi”), como uma fazendeira viúva na série “As Brasileiras”, na qual viverá um romance contra a aceitação da filha, interpretada pela Sandy Lima.

Em conversa exclusiva com o iG, Regina também comentou que não assiste às maldades do seu filho,Gabriel Braga Nunes, em “Insensato Coração”. “Me senti mal muitas vezes vendo esta novela”, diz.


iG: Elizabeth Bishop, ao chegar ao Brasil, tem uma visão meio Carlota Joaquina de tudo que vê. Como ela muda de ideia e se apaixona pelo País? 
Regina Braga: Carlota Joaquina dos nossos tempos (risos)! Ela chega no porto de Santos, em dezembro, e acha tudo horrível. Tem um poema no qual ela descreve aqueles morros todos. Come um caju em Petrópolis e fica doente, pega uma alergia, e se interna no Rio. Fica apavorada, acha tudo corrupto, desorganizado, feio, provisório... Mas aí ela sente nosso calor humano, começa a tomar banhos de cachoeira, e aí se tornou uma poeta muito melhor.

iG: Qual é o grau de importância, a seu ver, de Elizabeth na poesia americana?
Regina Braga:
Só os mais intelectuais a conheciam. Mas ultimamente teve milhares de livros sendo lançados pelo mundo, tudo sobre ela... Teve um americano que esteve na Flip, o Michael Sledge, Ele lançou “A arte de perder”, baseado na vida e obra dela. Elizabeth foi amiga pessoal de Vinicius de Moraes e Manoel Bandeira. Adorava Drummond, conhecia João Cabral de Melo Neto. Ela era poeta revolucionária nos Estados Unidos.

iG: E como é sua ligação com a poesia?
Regina Braga:
 Elizabeth me aproximou mais desse universo. Gosto dessa estranheza que ela tinha ao descrever o que via. “Eis uma costa/ Eis um porto...”. Ela te pega pela mão e começa a mostrar o que está vendo.

iG: O público expressa alguma reação negativa pelo fato de a personagem da peça ser lésbica?
Regina Braga:
 Há dez anos trás, era muito pior, sabia? As pessoas vinham me perguntar: ‘como é que você faz para fazer uma gay?”. Gente, como se isso fosse de um universo tão distante! Eu falava ‘mas que isso. Você está falando do quê?’. Como se fosse um ser diferente, sabe? Eu sinto que, pela reação de vários casais, a maioria sendo casais de mulheres, que vinham me procurar depois da apresentação, dizendo ‘muito obrigada pelo respeito que você está lidando com este tema’. Respeito? Então quer dizer que as pessoas não estavam acostumadas a serem tratadas com respeito.

iG: Você ainda sente a sociedade careta em relação a este assunto?
Regina Braga:
 Tem nichos caretas. Mas quanto mais se discutir, melhor.

iG: Onde o público lida melhor com esta temática: na TV ou no teatro?
Regina Braga:
 Tem que ser falado em geral. Tem que ser levado a sério. Tinha uma época que só aparecia gay no Brasil para fazer piada sexual, totalmente caricatura, um deboche. Para fazer rir os imbecis. Piada de sexo é para imbecil.

iG: Como quebrar este tabu?
Regina Braga:
Quebrar? Este termo dá ideia de bater e quebrar, no sentido de ser uma coisa agressiva. Talvez não seja quebrando, mas abrindo para conversas. Quanto mais informação as pessoas tiverem, mais educação e pensamentos ela terá para contrapor a realidade e rever a história.

iG: O que te leva a declarar a sua opção sexual?
Regina Braga:
 Sinceridade. Eu acho que nós somos, o ser humano em geral, bissexual. Eu sou bissexual, qual é o problema? Depende das circunstâncias, a gente pode ser expressamente gay ou não. Mas que todo mundo tem isso dentro da gente, ah, isso tem.

iG: Como você se deu conta disso? 
Regina Braga: Temos que falar mais abertamente dessas coisas, tem que se tornar mais público. Não pode ficar só nestas coisas rasas. Achei importante ser sincera. Sinto isso em geral nas pessoas, tem que se desenvolver mais isso. Todo mundo é bissexual. E pode ficar homo ou não. Isso é secundário.

iG: Como sua bissexualidade aflora? Já se envolveu com mulheres?
Regina Braga:
 Eu me envolvo todos os dias. Todos os dias tenho várias paixões na minha vida. Tenho muitas amigas íntimas. Tenho esta sensação de que posso escolher o que eu quiser. Se eu quisesse viver com uma mulher eu poderia.

iG: O que o Dráuzio acha disso? 
Regina Braga: Ele sabia desde sempre... Eu vivo com ele. Eu não escolhi viver com uma das minhas amigas. E ele está feliz com isso. E eu também.

iG: Você sofreu preconceito em algum momento da vida, por pensar e falar disso abertamente?
Regina Braga:
 Para falar a verdade, não (pausa). Ao contrário, sinto que as pessoas estão ávidas por quererem se ampliar. É claro que eu devo frequentar ambientes bem mais abertos que muita gente. De forma geral, em relação a esta questão gay, tão enraizada na humanidade, quando converso com as pessoas sobre isso, elas percebem como é normal. Mas tem casos lamentáveis, sempre.

iG: Como quais, por exemplo?
Regina Braga:
Como aquele em que pai e filho foram confundidos com casal homossexual e foram agredidos. Isso é grupo terrorista!

iG: Você está com 62 anos. Sua relação com o sexo mudou depois dos 60?
Regina Braga:
 Sexo na terceira idade? (risos) Olha, aqui em casa está sendo possível (risos). É normal quando as pessoas estão em boa saúde. O sexo fica com elas até o fim.

iG: Há quanto tempo está casada?
Regina Braga: 
Há trinta anos. Muito tempo, né? É bom, bom mesmo! Meu segundo casamento. No primeiro, fiquei dez anos casada com o pai do Gabriel e da Nina, que é fisioterapeuta. Ela tem duas crianças pequenas. Gabriel é um ano mais velho que ela.

iG: Tem acompanhado as cenas do Gabriel em “Insensato Coração”?
Regina Braga:
 Me senti mal muitas vezes vendo esta novela. Quando ele está por cima, costumo assistir melhor. Aquele jeito psicopata de ser é interessante. Mas agora, que ele tem sofrido, não gosto de ver, não. Logo no começo da novela tinha um acidente de moto, fiquei com as imagens na cabeça. É o meu filho, é a cara dele ali. Evito ver.

iG: Já teve pesadelo com o Léo (personagem do Gabriel)?
Regina Braga:
 Pesadelo ainda não. Mas olha só, Dráuzio uma vez viu alguém apontando o revólver na cabeça dele, numa dessas cenas da novela. De noite, ele não conseguiu dormir. Só pensando no Gabriel com o revólver mirado na cabeça. A gente fica com estas imagens, isso não é bom. Me incomoda muito este tipo de cena.


Comentários